Estudo analisa se exposição alimentar a toxina BMAA pode desencadear sintomas de perturbações neurodegenerativas. Segundo pesquisadora, prémio valoriza “compromisso das instituições portuguesas e dos seus cientistas em fazer ciência de qualidade”. Por Matilde Mendes e Inês Reis
No dia 15 de novembro, ocorreu, em Lisboa, a cerimónia de entrega dos Prémios Pfizer 2023, que distinguem trabalhos de investigação básica e clínica elaborados por instituições portuguesas. Sandra Morais Cardoso, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), e Nuno Empadinhas, ambos investigadores de Neurociências e Biologia Celular da UC (CNC-UC), foram premiados pelo seu estudo interdisciplinar acerca da relação direta entre o intestino e a Doença de Parkinson.
Esta condição é uma perturbação cerebral que resulta da redução dos níveis de dopamina, o que afeta os músculos e a atividade cognitiva. O projeto intitulado “Footprints of a microbial toxin from the gut microbiome to mesencephalic mitochondria” pretende analisar o efeito da toxina microbiana β-N-metilamino-L-alanina (BMAA) nesta doença neurodegenerativa.
A professora da FMUC explica que “a toxina leva à destruição de bactérias que estão no intestino e são fundamentais na regulação da sua resposta imunitária”. Com isso, após a testagem em animais, que consistiu numa dieta à base desta toxina, verificou-se um processo inflamatório no intestino que resultou numa inflamação sistémica. Numa fase final, constatou-se uma progressiva neuroinflamação que culminou na morte de neurónios sintetizadores de dopamina e em disfunção motora. Esta sucessão de eventos e respetivos sintomas, causados pela toxina, observam-se também em doentes de Parkinson.
Este estudo visa analisar se a exposição alimentar contínua à BMAA pode desencadear determinados sintomas de Parkinson. Segundo o microbiólogo, Nuno Empadinhas, a toxina encontra-se sobretudo no marisco, bivalves e noutras espécies marinhas. Porém, Sandra Morais Cardoso realça que “não se sabe quais são as doses desta neurotoxina no ambiente, nem as quantidades em que é consumida”. Quanto ao facto de não existir monitorização da BMAA pelas entidades de saúde pública, a cientista relembra que “muitas coisas não estão a ser controladas, mas a convicção é a de que ninguém consome esta toxina de modo exagerado”.
Ao receber o mais antigo galardão na área da Investigação Biomédica em Portugal, a pesquisadora diz sentir-se honrada: “é um grande orgulho termos sido agraciados com este prémio, que é muito relevante na ciência portuguesa”. Destaca ainda “o compromisso das instituições nacionais e dos seus cientistas em fazer ciência de qualidade”.
O objetivo para o futuro do projeto é “tentar parar a doença no intestino do modelo animal antes de chegar ao cérebro e haver um comprometimento sistémico”. De modo a dar continuidade a estas investigações, contam com o apoio financeiro da Cure PD, uma fundação do Reino Unido, que visa a encontrar uma cura para a Doença de Parkinson.
