Cultura

Divergente: Jornalismo de raiz

Joana Carvalho

Jornalista de revista digital independente conta histórias aprofundadas de vozes pouco ouvidas. Cofundadora aponta para a necessidade de tempo e uma equipa “em redações despidas de jornalistas”. Por Luísa Malva

A Divergente, revista digital, pratica o jornalismo lento e foca-se em géneros como reportagens de investigação e documentários narrativos. Sofia Rodrigues, repórter e cofundadora deste projeto, destaca a importância do jornalismo independente no panorama democrático mediático.

A cofundadora da Divergente considera o jornalismo independente uma mais-valia para a democracia. Sofia Rodrigues crê que se vive num “deserto mediático e que qualquer iniciativa que traga outras abordagens e formas de fazer jornalismo são bem-vindas”.

O benefício do trabalho desenvolvido pela revista digital, segundo Sofia Rodrigues, é o foco nas histórias dos entrevistados. A edição exerce jornalismo lento, pelo que os seus jornalistas fazem questão de passar tempo com as fontes, de modo a conhecer bem a sua história. “As abordagens não são preto no branco, bom ou mau. Nós tentamos focar-nos no cinzento”, remata.

A jornalista explicita que nenhum órgão de comunicação independente substitui os média tradicionais. Sofia Rodrigues considera que ambos os órgãos se complementam e que há oportunidade para uma variedade de parcerias mútuas. “Portugal não teria informação se só existisse a Divergente e o Fumaça, temos o luxo de poder fazer esse jornalismo com tempo, mas isso não chega”, afirma. Nesse sentido, a profissional admite que “as pessoas precisam de informação diária”.

Sofia Rodrigues sublinha a falta de financiamento também em meios de comunicação tradicionais, o que impossibilita uma pesquisa aprofundada. “Há falta de dinheiro a investir nas idas ao terreno para reportagens”, explicita. Para além disso, a jornalista considera a tirania do tempo “um problema estruturante do mundo capitalista”, que afeta o jornalismo. “É preciso tempo e uma equipa, e é isso que falta hoje em dia nas redações, que estão despidas de jornalistas “, acrescenta.

A repórter reforça o poder das palavras na escrita jornalística, na medida em que “as palavras importam e são armas”. A cofundadora da Divergente exemplifica com o tipo de linguagem na cobertura do conflito entre Israel e o Hamas. “O contexto é preciso, sobretudo neste conflito. É preciso saber a história do território que é agora a Palestina. Os judeus não são todos sionistas, os palestinianos não estão todos com o Hamas”, conclui.

Por sua vez, Sofia Rodrigues realça a problemática de género nas redações portuguesas como parte de um “problema sistémico”, em que quem chega aos cargos de topo são homens e quem se encontra na base são mulheres. Em contrapartida, salienta que a maior parte dos licenciados em jornalismo em Portugal são mulheres. A jornalista considera essencial para o jornalismo independente “fugir às agendas feitas pelas redações e procurar novas vozes”.

Na investigação dirigida pela Divergente, intitulada de “Escondidas, elas também fizeram a Revolução”, a revista digital procurou dar voz às mulheres que ajudaram a construir o 25 de abril. “Falsificavam documentos, protegiam a casa, possibilitavam que os seus maridos fossem para reuniões e fizessem a resistência, cuidavam dos filhos e permitiam que existisse uma certa normalidade na vida familiar ao mesmo tempo que tinham tarefas muito importantes”, conta. Sofia Rodrigues considera ainda a história uma luta pela memória. “Quem nunca é recordada não fará parte da história”, remata.

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