Problemas internos motivam pedido de renúncia e desacordo entre membros. Autor do documento teme prejuízos no trabalho futuro do órgão. Por Daniela Fazendeiro e Alexandra Guimarães
Eurico Figueiredo, 3º vogal da Comissão Disciplinar da Associação Académica de Coimbra (CD/AAC), publicou nas redes sociais, na passada segunda-feira, uma carta aberta dirigida às estruturas da AAC. No documento, o autor exige a demissão do presidente da CD/AAC, Pedro Martins, por falhas que aponta no decorrer do mandato.
O estudante esclarece que o posicionamento público “resulta de um desenrolar de acontecimentos”. Conta que, após a tomada de posse a 10 de março de 2023, realizaram-se “reuniões informais” para rever o regimento interno, das quais resultou “um documento partilhado com sugestões”. No entanto, a 25 de abril, “o presidente apresentou um documento distinto do que tinha sido trabalhado”, refere. O novo regimento interno foi aprovado por Pedro Martins e Ana Vidal, 2ª vogal da CD/AAC.
Eurico Figueiredo nomeia as duas principais diferenças entre os documentos. Em primeiro lugar, o novo não inclui o artigo 93º dos Estatutos da AAC, que obriga a cooperação por parte dos associados com a CD/AAC. O vogal esclarece que, durante as reuniões informais, Pedro Martins votou a favor da proposta relativa à inclusão do artigo no regimento interno. Em segundo lugar, o documento alterado estabelece que o dirigente é responsável pela distribuição dos processos, em oposição ao procedimento de atribuição aleatória que tinha ficado definido. Declara ainda que a alínea, não aprovada, que previa que o presidente podia encarregar-se do processo de outro relator e arquivar ou redigir uma nota de culpa acusatória para o Conselho Fiscal da AAC “roçava o abuso de poder”.
Durante o mês que se seguiu, “Pedro Martins não distribuiu processos”, relata Eurico Figueiredo. Esta atitude causou, a 24 de maio, uma alteração no regimento interno em relação à competência de distribuição de processos, que passou das mãos do presidente para sede de plenário. O autor da carta acusa ainda Pedro Martins de ”causar entropia ao demorar a assinar documentos, ao não ler atas e ao não responder no grupo”. Acrescenta que, nas frases de campanha em que aponta a inação de membros anteriores, o dirigente “parecia estar a falar de si no futuro”.
Eurico Figueiredo admite ter ficado “surpreendido” quando no plenário realizado a 22 de junho Pedro Martins admitiu “não ter disponibilidade, nem soluções” e cogitou a possibilidade de desistir do órgão caso tal não mudasse. À data, o presidente da CD/AAC estava “responsável por um processo há 40 dias e não mostrava avanços”, reforça. A 12 de julho, Eurico Figueiredo pediu a Pedro Martins “para renunciar ao cargo até às 17h30 da sexta-feira seguinte”. Tal não aconteceu, o que motivou o pedido de demissão público.
Conflito interno gera desacordo
“O primeiro objetivo é não compactuar com esta situação e expô-la em público”, explica o autor do documento e acrescenta que pretende “pressionar publicamente o presidente”. Apesar de “esperar que Pedro Martins se demita”, Eurico Figueiredo garante renunciar ao cargo, caso isso não aconteça.
Ana Vidal desconhecia o conteúdo da carta tornada pública quando prestou declarações ao Jornal Universitário de Coimbra – A CABRA. Explica que lhe foi apresentado um documento na sexta-feira passada e não sabe se este sofreu alterações até à sua publicação. Afirma ainda que o documento, a que não tem acesso e no qual não consta a sua assinatura, foi redigido por Eurico Figueiredo e subscrito por Diogo Curto, 1° vogal da CD/AAC. “Não concordo com os moldes em que [a carta] foi elaborada, publicada e enviada aos meios de comunicação”, acrescenta. Eurico Figueiredo afirma que a colega leu a carta e escolheu não assinar.
Quando tomou conhecimento da primeira versão do documento, a estudante apelou à continuação da resolução dos problemas através de “meios de conversação”. Considera que para além de não ter havido o diálogo interno necessário, a tomada de posição externa não é correta.
Quanto à recusa de renúncia ao cargo de presidência por Pedro Martins, Ana Vidal acredita que a mudança de postura “resultou de um processo de introspeção realizado pelo próprio que lhe permitiu concluir que o seu comportamento não impedia os trabalhos do órgão”. Isenta-se de comentar o comportamento de Pedro Martins descrito na carta por não saber como esta foi formulada. Para Eurico Figueiredo, o câmbio de posição do presidente provém da “negação da procrastinação que apresentou ao longo dos últimos meses”.
O futuro (incerto) de uma Comissão Disciplinar “virada do avesso”
O autor da carta alerta que “a falta de capacidade do presidente minou o trabalho da CD/AAC” e reforça a necessidade de “escoar processos de anos anteriores”. No seu entender, se Pedro Martins continuar no cargo, “as coisas não vão ficar bem”, visto que não acredita “num ato de lucidez e num trabalho incrível, porque até agora não o fez”. Caso contrário, o vogal explica que “quem sobe é Ana Vidal, a presidente de verdade desde o início do mandato”, enquanto sublinha a sua “liderança, disponibilidade e o voto de confiança de todos”.
Ana Vidal defende que o órgão está em funcionamento, com nove processos em aberto. “Apesar desta situação, os trabalhos vão continuar, porque os conflitos não existem há três dias”, reitera. A estudante menciona sentir-se satisfeita com a CD/AAC, pois acredita que os membros estão a exercer um “trabalho impecável” após entrarem “num órgão virado do avesso”. Contudo, sente que, neste momento, o desenvolvimento dos processos é uma “coisa que pode não interessar”.
Diogo Curto, que subscreveu a carta, realça que “o órgão é muito necessário para o funcionamento da AAC”. Apesar destes “obstáculos circunstanciais” e do “descontentamento geral” entre os colegas face à situação, defende a necessidade de dar continuidade aos progressos alcançados. Contudo, o vogal frisa que para tal “é preciso que sejam cumpridas as competências ao nível da presidência, que não estão a ser cumpridas”.
Até à publicação deste artigo, o presidente da CD/AAC, Pedro Martins, não quis prestar declarações por ter sido surpreendido pela posição assumida pelos seus dois colegas.
