Cultura

Eles “tunam” tudo e não deixam nada

Gustavo Eler

Tunas trazem internacionalidade ao som do pandeiro em noite de Festival. Atuações marcadas por homenagens ao Brasil e Zeca Afonso, bem como críticas ao reitor. Texto e fotografias por Renato Duarte e Gustavo Eler

Depois de três anos em pausa, a sexta edição do Trovador, festival dinamizado pela FAN-Farra Académica de Coimbra,  animou o Teatro Académico Gil Vicente (TAGV). O evento trouxe, mais uma vez, tunas de outras regiões do país para atuar num concurso que culminou numa entrega de prémios e contou com vários convidados.

O festival contou com a apresentação de Eurico Figueiredo, tuno da FAN-Farra Académica de Coimbra, que se caraterizou por um tom humorístico e, ao mesmo tempo, interventivo. No seu discurso de abertura apresentou se a tuna anfitriã enquanto um grupo que “gosta de cerveja e de tocar umas músicas”, descrição com mas que, como dito pelo tuno, não impede os membros do grupo académico de serem “estudantes de Coimbra e de ter uma consciência”.

A noite foi pautada pelo bom humor e disposição do apresentador a quem, no decorrer da noite, se juntou Isaac Machado, também ele membro da FAN-Farra Académica de Coimbra.  A dupla de anfitriões animou a plateia do auditório do TAGV ao interagir com o público, com um jogo de adivinhas e  promessas de cerveja. Foram pedidos “temas fraturantes” ao público para manter a conversa, como “cereais antes ou depois do leite” e “peru ou bacalhau no natal”.

As críticas à reitoria foram recorrentes e focaram-se na problemática das cantinas. Eurico Figueiredo não se inibiu quando lhe foi pedido pela plateia para contar uma piada. Assim, o estudante falou sobre uma notícia recente que dizia que “o reitor se ia recandidatar”. Em relação às cantinas, o apresentador falou sobre as filas “repletas de pessoas”, e reiterou que “há menos procura porque há menos oferta”, frase que terminou ao som dos aplausos do público.

O serão teve início ao som dos bandolins d’As FANS – Tuna Feminina da Universidade de Coimbra. O grupo convidado revelou ser “uma honra estar presente” no festival da sua “tuna irmã”. Depois da apresentação da sua versão de “Sonho a Preto e Branco”, da apdatação da música “Sinhô” de Né Ladeiras, e do tema original “Vejo-te Depois”, a tuna terminou com outra canção original que homenageia a história de D. Pedro e Inês de Castro, “Fonte dos Amores”.

O grupo coral Os Rama Verde foi outro dos convidados da noite. Depois de anunciado como “uma surpresa vinda do Alentejo”, o grupo de cante alentejano subiu ao palco para apresentar três temas que falavam sobre o Alentejo e o trabalho no campo. Provenientes de Alvito, vila do distrito de Beja, o grupo trouxe uma sonoridade diferente a uma noite em que ecoavam os sons dos instrumentos e vozes dos grupos académicos, pelo que davam agora lugar somente à voz. No último tema homenagearam a sua vila de origem que, ao cantar, revelaram ser “a mais bonita deste nosso Portugal”.

Tunas a concurso

O primeiro grupo a apresentar-se foi a Tuna de Engenharia da Universidade do Porto (TEUP). Os rapazes do Pólo de São João da UP trouxeram consigo a sua claque “Havaianas”, que teve honras de menção ao longo da performance e que puxou pelo espírito da tuna do Porto do início ao fim da sua atuação. No centro do palco estavam presentes uma bateria, um bombo e congas, instrumentos que foram abraçados e colocados em destaque ao longo da atuação.

Numa atuação composta por cinco temas, a TEUP trouxe até Coimbra música em espanhol e homenageou a cidade do Porto com referências ao espírito das festas de São João no tema “Da Ribeira às Fontaínhas”. A tuna trouxe, ainda, um “grito de revolta a pedir por dias melhores”, forma como descreveram o seu instrumental original “Índio do Brasil”. No fim da atuação, para além dos habituais aplausos, o público e a tuna foram presenteados com uma corrida efusiva ao longo de todos os corredores do auditório por parte da claque da tuna vinda da cidade invicta.

A Tuna Universitária de Aveiro foi a segunda tuna a concurso no VI Trovador a atuar e começou por revelar que vinha a Coimbra cantar “a esses vampiros de hoje em dia”. Com o tema “Vampiros”, da autoria de Zeca Afonso, sublinharam, através da música, que “eles comem tudo e não deixam nada”.  De entre os cinco temas apresentados, a tuna de Aveiro interpretou, ainda, a canção “Menina do Alto da Serra” e voltou a interpretar Zeca Afonso, com “Fantoches de Kissinger”.

Terminaram com aquilo que sabem “fazer de melhor e de pior”, como dito pelos próprios, ao interpretar o tema “Amor à Beira Mar”. Com um público que se divertia com as intervenções e vibrava ao som das violas da TUA, a tuna criada em 1991 despediu-se com um obrigado “a Coimbra, aos pais, às mães e ao Preço Certo pela companhia”.

A Trovantina, tuna do Instituto Politécnico de Leiria, foi a terceira participante do concurso e iniciou-se com a música “Castelo de Leiria”. Descritos como “aqueles do chapéu com bico” pelos apresentadores, o grupo seguiu a sua apresentação com “Amnistia”, um dos seus sons originais que é descrito como uma “sátira aos tempos modernos”. Ainda dedicaram “Eu sei que vou te amar”, de Tom Jobim, para todas as “donzelas” presentes no VI Trovador.  

Em homenagem ao Brasil, a Trovantina puxou o tema instrumental “o Brasileirinho”, com destaque para as pandeiretas e os agogôs. Na marcação rítmica do contrabaixo, a tuna apresentou “Cantigas do Maio” de Zeca Afonso. “Viva aos estudantes, viva aos licenciados, viva aos mestres, estamos todos a lutar pelo mesmo” declararam os tunos de Leiria ao tocar “o Pipo” como última música de sua apresentação. Antes de saírem do palco, levantaram um estandarte de mais de dois metros a dizer “Obrigado Coimbra!”. 

Para finalizar o concurso, foi a vez da Tuna Académica da Guarda tomarem o TAGV. Os chamados Copituna d’Oppidana arrancaram com “Medley” dos Quinta Bill e seguiram com a música instrumental “Domingo à Tarde”. Zeca Afonso foi referenciado de novo com o tema “A Morte Saiu à Rua”, seguido de “Playback”, tema de Carlos Paião, momento em que os pandeiretas puderam brilhar com a sua dança.  

O tema original “Menina Caloira” marcou presença no repertório da tuna da Guarda. Os pandeiretas voltaram a ter destaque com a música “Capa ao Ombro”, que narra a história de uma tuna que vai de “terra em terra” com sua bandeira. O final da apresentação deu lugar ao solo “20 anos”, de José Cid. 

“Há 35 anos que somos canção desta cidade”, afirmou Eurico Figueiredo ao abrir o palco para a FAN-Farra Académica de Coimbra fazer a sua apresentação de encerramento. Após a declamação de mais um poema, acompanhado pela viola, iniciou o solo de Daniel Tadeu com a música “Caminho” em homenagem ao “povo imortal”.

Num dado momento da apresentação, foram chamados a palco os “velhos” tunos, com destaque para um que dedicou uma das músicas à sua amada que estava na plateia. O antigo tuno termina a música com  um pedido de casamento em cima do palco do TAGV. O recém noivo retornou ainda ao palco para dar performance a “A Lenda Encantada” com as suas pandeiretas. 

Antes de finalizar o evento, seguiram-se as entregas de prémios às tunas. Os júris e os convidados receberam lembranças pelas suas participações. A TUA recebeu o prémio de melhor instrumental. A Copituna d’Oppidana venceu nas categorias de melhor solista e melhor pandeireta. Os troféus de melhor original e melhor serenata ficaram para a Trovantina e o de melhor estandarte foi para a TEUP.  O prémio de melhor tuna deste Trovador foi atribuído à TEUP e as celebrações continuaram no convívio, que se realizou após o término do evento, nos jardins da Associação Académica Coimbra. O encerramento do espetáculo deu-se ao som de “Trovador”, primeira música do primeiro álbum da FAN-Fanfarra Académica de Coimbra.

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