Conto assenta em troca de correspondência entre pai e filha acerca da sua perspetiva sobre
cidade de Lisboa. Para Manuel Alegre, descoberta de autores em Coimbra pode significar
“retoma da tradição literária que Coimbra teve no passado e que é bom que volte a ter outra
vez”. Por Luísa Macedo Mendonça
Na passada quarta-feira, dia 21 de setembro, realizou-se na Faculdade de Letras da
Universidade de Coimbra (FLUC) a entrega do prémio literário Manuel Alegre. A obra premiada
da 2ª edição do concurso promovido pela Associação Académica de Coimbra (AAC) foi “Vinte
Seis Postais”, de Laura Venceslau, pseudónimo de Rodrigo Cid. Junto com esta, também Pedro
Dinis Silva, Maria Miguel Pereira, João Francisco Ferreira, Sofia de Abreu Duarte foram
distinguidos com menções honrosas.
“Vinte Seis Postais”
O conto vencedor trata da história de uma rapariga filha de portugueses, nascida na
Alemanha, que resolve, um dia, vir a Lisboa pela primeira vez. O título nada tem de metafórico,
tal como ressalva o próprio autor, uma vez que gira em torno da correspondência que essa
rapariga troca com o seu pai e aborda, de modo principal, a forma como estava “iludida com
as coisas boas que tinha ouvido da cidade”, como indica Rodrigo Cid, e acaba por focar os
aspetos menos bons da capital. Como o próprio indica, “não é que eu me reveja na
protagonista, mas achei que devia utilizar algumas das personagens para expressar um
bocadinho o meu olhar sobre a cidade”. Manuel Alegre, cara e nome do prémio, constatou
que o texto vencedor “revela já uma grande maturidade e um grande sentido de literatura”
Como indica José Manuel Mendes, presidente da associação portuguesa de escritores,
ressaltou que, entre outros aspetos, o “desfecho inesperado, encontrado num caminho menos
óbvio e mais sugestivo, fez com que o júri, de forma clara, o tenha preferido como sendo o
vencedor”.
O autor
Rodrigo Cid, de 42 anos, licenciou-se na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da
Universidade Nova de Lisboa e, há cerca de dois anos, iniciou uma pós-graduação em artes da
escrita na sua antiga faculdade. Como o próprio refere, “uma das cadeiras da pós-graduação,
que assentava sobretudo na temática epistolar, levou-me a começar de escrever, umas coisas
por obrigação, outras nem por isso” e daí surgiu o conto que viria a ganhar a segunda edição
do prémio literário Manuel Alegre. Já o seu pseudónimo, Lara Venscelau, surgiu porque o
autor considera ter “boa sonoridade”.
Rodrigo Cid confessa que ter ganho o concurso foi uma “surpresa”, ainda para mais tendo sido
deliberado de forma unânime pelo júri, e um “grande motivo de orgulho”. Acrescenta que o
que ouviu do júri o “motivou muito” para continuar a escrever, e admite ainda dedicar o valor
recebido como prémio (2000€) a um curso de guionismo, estilo no qual “gostava de se
aventurar”. Acima de tudo, o autor confessa sentir-se “sentia um privilegiado por saber que
uma coisa minha ia ser lida por gente tão ilustre do mundo literário e académico”. Termina a
parabenizar a AAC pela iniciativa, “sem a qual a maior parte dos textos (senão todos) nunca
teriam sido de uma gaveta ou de uma pasta do desktop”. Ressalta ainda o empenho da
Académica num ano complicado e conclui ao afirmar que “no que toca a este tipo de iniciativa,
a AAC sobressai em relação às outras Associações Académicas, o que é de louvar”.
Júri
O júri do concurso incluiu os nomes de, para além dos já referidos José Manuel Mendes e
Manuel Alegre, Alberto Martins, antigo presidente da Direção-Geral da AAC (DG/AAC) na
altura da crise académica de 1969; Clara Rocha, primeira mulher presidente da DG/AAC,
especialista em literatura portuguesa; Guilherme d’Oliveira Martins, atualmente administrador
executivo da fundação Calouste Gulbenkian. No entanto, a pré-seleção dos textos foi levada a
cabo por pessoas da DG/AAC e da Secção de Jornalismo da AAC (SJ/AAC). Bruno Oliveira,
presidente da SJ/AAC, ressalvou que “a cultura na AAC não deveria existir sem as secções
culturais, que são um dos motores da cultura dentro da cidade de Coimbra e o motor dentro
da AAC, pelo que acho que a parceria fez todo o sentido”.
Neste sentido, o vice-presidente da cultura da DG/AAC, Daniel Aragão declarou que “não faria
sentido avançar com uma iniciativa da DG/AAC sem a envolvência das próprias estruturas,
porque são elas a base da AAC” e revela que houve “uma dinâmica de trabalho conjunto muito
frutífero para os estudantes e para a cultura”. Neste caso, as secções envolvidas foram a
SJ/AAC, mas também a tv/AAC e a Rádio Universidade de Coimbra (RUC), que foram
responsáveis por parte da divulgação, às quais Daniel Aragão deixa um “profundo
agradecimento”. O vice-presidente da cultura defendeu, então, que “este tipo de dinâmica
deve perdurar para o futuro”.
Parceria com a LEYA
O conto vencedor vai ser agora editado e publicado numa parceria com a editora LEYA e, de
acordo com Daniel Aragão, vai sair por volta do segundo semestre do próximo ano, mas vai
depender das condições da editora. O vice-presidente justifica o atraso na publicação com “a
crise global do papel”, que atrasou já o lançamento do texto vencedor da primeira edição do
prémio, que vai sair em março, em princípio. Ainda assim, a fim de “sistematizar e estruturar a
dinâmica” com a editora no futuro, Aragão adianta que a DG/AAC vai assinar um protocolo
com a empresa com o propósito de “facilitar as edições futuras”.
Sessão de entrega de prémios
A cerimónia de entrega de prémios contou também com a presença de Albano Figueiredo,
diretor da FLUC, João Gouveia Monteiro, diretor da BG, e também o vice-reitor da cultura e
ciência aberta, Delfim Leão. Para Daniel Aragão, a presença do vice-reitor demonstrou o
“respeito que a UC tem por esta iniciativa da AAC”. A sessão contou com a presença de um
grupo de fados e guitarradas, assim como diversas homenagens feitas pelos presentes à cidade
de Coimbra, assim como a declamação do poema “Tempo que não passa”, de Manuel Alegre,
por Daniel Aragão. Na sua intervenção final, Manuel Alegre ressalvou que “o mais importante
é que os jovens não tenham medo de escrever, não tenham medo das palavras e de deixar
fluir o seu pensamento e o seu imaginário” e ressalta a importância do concurso para o
“desabrochar de novos autores”. Para além do texto vencedor, também Pedro Dinis Silva,
Maria Miguel Pereira, João Francisco Ferreira, Sofia de Abreu Duarte tiveram direito a menção
honrosa.
Em princípio, no próximo ano vai ter lugar a terceira edição e Manuel Alegre considera que
continuidade do prémio vai garantir o surgimento de novos autores, e, assim “a retoma da
tradição literária que Coimbra teve no passado e que é bom que volte a ter outra vez”. Para
Daniel Aragão, o mais importante é “ano a ano conseguirmos criar mais sinergias na AAC e, no
fim de contas, honrar aqueles que nos deram a cultura, assim como a cultura que temos”. Em
conclusão, Manuel Alegre encerrou a cerimónia ao apelar mais concorrentes na próxima
edição, para que “estejamos aqui outra vez a premiar a saudar os novos talentos que [tem] a
certeza que este prémio vai trazer à luz”.
