Equipa vai analisar traduções portuguesas do iluminista francês nos seus contextos histórico, literário, cultural e político. Trabalho vai permitir “compreender e reescrever momentos da literatura e cultura portuguesa”, segundo coordenadora do projeto. Por Débora Cruz
“Cartografar Voltaire em Portugal e na Literatura Portuguesa” junta investigadores e conselheiros científicos de várias universidades, nacionais e estrangeiras, com o objetivo de estabelecer uma rede da cartografia literária e cultural internacional do autor e filósofo. O projeto, liderado por uma equipa de cientistas da Universidade de Coimbra (UC), procura cartografaras traduções portuguesas da obra de Voltaire, desde o final do século XVIII até à contemporaneidade.
No domínio das cartografias literárias/culturais, o projeto adotou uma metodologia inovadora pelo facto de apostar no formato digital. Desde logo, foi criado um ‘site’ onde é publicado o trabalho realizado pela equipa até ao momento. Marta Teixeira Anacleto, coordenadora do estudo e docente da Faculdade de Letras da UC (FLUC), esclarece que a página funciona como um “ponto de chegada da primeira etapa do projeto”, relativa ao levantamento das traduções, e como um “ponto de partida para as outras tarefas”. Numa fase posterior, vai-se criar uma base de dados interativa e aberta ao público que vai conter hiperligações para as páginas das bibliotecas em que se encontram as obras traduzidas. Além disso, a base de dados vai estar conectada a uma antologia digital comentada e a um volume de estudos temático.
A coordenadora do trabalho explica que no âmbito dos estudos e da teoria literária, o termo “cartografia” pressupõe “um processo de tradução e de reescrita dos textos de uma determinada literatura nacional noutras literaturas estrangeiras”. No caso do projeto, o termo refere-se a uma “viagem metafórica dos textos de Voltaire, em Portugal”, atesta a docente da FLUC. A professora catedrática declara que a escolha de cartografar as obras do iluminista francês derivou da “dimensão inerente e intrínseca de viagem” dos seus textos, visto que Voltaire frequentou várias cortes europeias durante o século XVIII.
Marta Teixeira Anacleto sublinha que o projeto vai permitir “colmatar a falta de estudo e análise” do espólio do iluminista, já que uma parte significativa das traduções foram “apenas analisadas em contextos mais isolados”. A docente frisa que, através de uma “equipa plural”, vai ser possível desenvolver um “estudo sistemático das traduções portuguesas de Voltaire e difundi-las a nível internacional”. Segundo a investigadora, o projeto possibilita ampliar o entendimento da literatura portuguesa de finais do século XVIII e do “teatro português do século XIX” e destaca também a “atualidade dos textos que apelam à tolerância”.
Estima-se que existem cerca de vinte traduções portuguesas da obra do autor francês referentes ao período do Estado Novo, tempo que a professora catedrática está encarregue de analisar. Marta Teixeira Anacleto aponta que a Polícia Internacional e de Defesa do Estado e a censura atuaram sobre as traduções do filósofo de uma forma indireta. “Verifica-se que existem desvios interpretativos daquele Voltaire revolucionário, há momentos e espaços dessa ideologia que são mais ou menos silenciados”, esclarece. A investigadora acrescenta que o estudo destas traduções vai “permitir fazer um estudo sociológico e cultural do Portugal da época”.
O trabalho conta com a participação de um conservador do museu Voltaire da Biblioteca de Genebra, na Suíça, e de um grupo de conselheiros das universidades de Paris-Sorbonne e de Rouen, em França, e da Fundação Voltaire da Universidade de Oxford, no Reino Unido. Apesar de não ter data marcada, prevê-se que o projeto seja concluído em 2025.
