Ex-presidente do CF/AAC entende que houve violações estatutárias na AM de dezembro. Dora Santo acredita que “os estatutos não estão escritos para a situação de pandemia que vivemos”. Por Tomás Barros, Bruno Oliveira e Daniela Pinto
Com a pandemia, as Assembleias Magnas da Associação Académica de Coimbra (AM/AAC) tiveram de ser repensadas. Em setembro, a solução encontrada foi organizá-las ao ar livre, no Campo Santa Cruz. O mau tempo não permitiu prolongar essa alternativa, pelo que o Auditório da Reitoria foi o local designado para acolhê-las. Na penúltima AM, surgiram as primeiras contestações ao facto de o espaço não ter lugar para as 250 pessoas necessárias para deliberar e levar a cabo as decisões. Já aí, o antigo presidente da Mesa da Assembleia Magna da AAC (MAM/AAC), Diogo Teixeira, admitia que esse espaço era a solução mais viável.
Na passada AM, que se realizou no dia 16 de dezembro, a contestação agravou-se por existirem pontos na ordem de trabalhos que, de acordo com o antigo e a atual presidente do Conselho Fiscal da AAC (CF/AAC), Francisco Costa e Dora Santo, exigiam o número de quórum mínimo para tomar decisões. Os assuntos em questão eram a discussão e aprovação do documento reivindicativo a ser entregue aos candidatos à presidência da República e ainda a apresentação e ratificação da Comissão Organizadora da Queima das Fitas 2021 (COQF’21). Dadas as discrepâncias com os Estatutos, Francisco Costa questionou via e-mail o CF/AAC, na pessoa da sua presidente e, após não ter recebido mais respostas, tornou públicas estas declarações aos órgãos de comunicação social da AAC .
O que se pode encontrar nos Estatutos da AAC, no artigo 28º, é que a AM precisa de 250 associados efetivos para deliberar, e apesar de se preverem sete exceções, para as quais são apenas precisos cem estudantes, os dois pontos acima não se incluem. No que diz respeito ao documento a entregar aos candidatos à presidência da República, no início da discussão, o presidente da Direção-Geral da AAC (DG/AAC), João Assunção, assumiu as eventuais decisões da AM como vinculativas.
Segundo Francisco Costa, a ação de João Assunção não estava prevista pelos Estatutos. Refere, aliás, que na última revisão estatutária, onde “estavam presentes os atuais presidentes da DG, MAM e CF, o ponto que permitia ao presidente da DG/AAC declarar para ata que aceitava as deliberações, na ausência das 250 foi retirado de forma intencional”. “Estatutariamente, o presidente da DG não era obrigado a fazê-lo”, admite João Lincho, mas ”ele decidiu comprometer-se a deixar o documento como a AM quis”.
O que dizem os estatutos
A ratificação da COQF’21 aconteceu com a aprovação de 201 estudantes, o que representa uma violação estatutária, como explica Dora Santo: “para a deliberação deste ponto eram necessárias 250 pessoas, porque não estava abrangido pelas exceções”. Apesar da transgressão, a presidente do CF/AAC afirma que o órgão que dirige não viu razão para “anular a Magna”. Em contrapartida, João Lincho esclarece que a ratificação da COQF’21 “requeria o quórum de 100 pessoas”. Aquilo que se pode ler nos estatutos é: “excetuam-se dos números anteriores (deliberar com a presença de pelo menos 250 associados) a aprovação e alterações relativas ao Regulamento de Organização e Funcionamento da Queima das Fitas” (Artigo 28º, ponto 3, alínea e).
Tendo em conta a ambiguidade e discórdia que o ponto gera, e analisando os Estatutos da AAC, conclui-se que se trata de um caso omisso. Pode ler-se no artigo 235º que “os casos omissos são integrados de acordo com a Constituição, a Lei e os princípios gerais do direito português” e remete ainda para o artigo 2º: “na aplicação dos presentes Estatutos, na interpretação das suas normas e na integração de lacunas, os Órgãos da AAC, em especial o Conselho Fiscal, terão sempre em conta os Princípios enunciados no presente artigo (ponto 1), e bem assim outros que, não estando neles expressamente delimitados, resultem da sua interpretação global”.
No início da reunião, a contestação surgiu de outra fonte. Desta vez, por parte de António Joaquim, estudante de Física da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, que fez notar que estavam pessoas à espera à porta do auditório, impedidas de entrar e participar. Perante isso, a AM foi suspensa por João Lincho, de maneira a verificar se a informação era verdadeira.
Segundo o presidente da MAM /AAC, estavam de facto pessoas à espera para entrar, mas acabaram por conseguir fazê-lo. No entender de Dora Santo, depois deste episódio não havia razões para suspender a AM. “A partir do momento que o presidente suspende para ver se há pessoas lá fora e pessoas acabam por entrar, assume-se que toda a gente que estava lá fora entrou”, explicita.
De acordo com Dora Santo, o Conselho Fiscal sabia que a lotação do auditório era inferior ao quórum necessário para deliberar os pontos que foram discutidos. Contudo, “não havia necessidade de haver nulidade da Assembleia Magna”. Apesar de o CF/AAC ter reconhecido que houve uma violação estatutária, e que esta não era suficiente para anular a AM, Dora Santo garante que, no futuro, o órgão vai atuar para prevenir situações semelhantes. Lembra ainda que “as pessoas devem ser mais conscientes, e perceber que os estatutos não estão escritos para a situação de pandemia que vivemos”.
A MAM/AAC tinha marcado uma AM para o dia 12 de janeiro, que foi entretanto cancelada devido ao evoluir da pandemia. No dia 7 de janeiro o CF/AAC emitiu um despacho que suspendia o ponto 2 do artigo 28º, reduzindo assim o quórum mínimo de deliberações de 250 para cem pessoas enquanto estiver decretado o Estado de Emergência no país.
Com Leonor Garrido e Maria Monteiro
