Relação entre homens e tecnologia foi tema da palestra. João Caraça defende que “a máquina não é culpada pela injustiça social”. Por João António Gama
O Rómulo – Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra acolheu esta terça-feira mais uma conversa informal. Com o mote “As Três Culturas: Deuses, Máquinas e Homens”, o presidente do Conselho Geral da Universidade de Coimbra (CG), João Caraça, propôs-se a explicar como é que a tecnologia tem influenciado a organização das sociedades históricas e a imaginar como é que a emergência da inteligência artificial pode vir a moldar as sociedades futuras.
João Caraça começou por discursar sobre as diferentes explicações do mundo de que a humanidade se tem servido desde ainda antes do início da História. Segundo o orador, deu-se uma evolução naquilo que as sociedades usaram para explicar as suas crenças. A primeira fase passou pela crença na magia, seguida pela religião e pela confiança nos mais recentes modelos científicos.
A estas mudanças de paradigma estão associados marcos tecnológicos ao nível da conservação e divulgação da informação, defende João Caraça. O presidente do CG associa a invenção da escrita à adoção da religião como visão de mundo e interroga-se sobre que visão pode surgir das novas tecnologias de informação e comunicação.
Servindo-se da obra “A cultura integral do indivíduo – problema central no nosso tempo” escrita pelo pai, o matemático e resistente antifascista Bento de Jesus Caraça, citou: “Os males não estão na máquina, mas na desigualdade de distribuição dos benefícios que ela produz”. Conta que “é um texto com quase cem anos, mas podia ser atual”. Para João Caraça, não é a máquina a culpada por um dos grandes problemas atuais, a injustiça social, mas sim os “interesses da finança internacional, que têm por trás gente muito pouco recomendável”.
O discurso humanista do palestrante ficou resumido na citação que escolheu trazer para a apresentação, da autoria do microbiologista Carl Woese: “uma sociedade que permite que a biologia se torne uma disciplina de engenharia, que deixa a ciência adquirir o papel de transformar o mundo vivo sem tentar entendê-lo primeiro, é uma ameaça para si própria”. Concluiu a conversa com um apelo à audiência, que não deixe que a racionalidade fria das máquinas se sobreponha à lógica humana, à estratégia. “O Homem distingue-se dos outros seres por conseguir pensar num tempo futuro, e o tempo é a liberdade”, reitera.
