Cultura

Gil Vicente regressa a Coimbra na “Embarcação do Inferno”

Fotografia gentilmente cedida por Paulo Nuno Silva

Peça vicentina viaja pelo país 500 anos depois. Representação da obra conta com sessões próprias para estudantes em dias úteis. Por Rafaela Chambel

Em outubro de 2016 estreou aquilo que Pedro Rodrigues, produtor n’A Escola da Noite, caracteriza como “o maior clássico da história do teatro em Portugal”. Esta semana, a peça “Embarcação do Inferno” regressou, no Teatro da Cerca de São Bernardo, com sessões no sábado, dia 17 às 21h30 e no domingo, dia 18 às 16 horas.

Trata-se de um espetáculo coproduzido pel’A Escola da Noite com a Cendrev (Centro Dramático de Évora). Estas duas companhias partilham um “gosto particular por trabalhar os textos de Gil Vicente”, afirma Pedro Rodrigues. Assim sendo, decidiram “reunir um conjunto de recursos humanos, materiais e financeiros” com o objetivo de reintroduzir a obra no quadro cultural do mundo do teatro, refere.

O elenco é composto por oito atores, dos quais cinco provêm do Cendrev e três d’A Escola da Noite. A encenação é partilhada entre os diretores artísticos das duas companhias: José Russo, do centro eborense, e António Augusto Barros, d’A Escola da Noite.

O produtor salienta que o título escolhido para a peça traduz uma homenagem ao professor Paulo Quintela, que “na década de 50 fixou uma versão do “Auto da Barca do Inferno”, ao cruzar várias versões disponíveis”. Deste modo, “o título “Embarcação no Inferno” é uma homenagem ao trabalho e ao contributo do professor para a visibilidade que deu ao trabalho de Gil Vicente em meados do século XX”, esclarece.

Desde Braga, no Theatro Circo, a Ponta Delgada, em São Miguel nos Açores, o espetáculo percorre o país nas mãos das estruturas que agora o ressuscitaram. Este “mantém-se em reportório, quer para dar resposta ao público que o viu nascer – Coimbra e Évora, quer para alargar o máximo possível o âmbito nacional desta digressão”, confessa Pedro Rodrigues.

“Auto da Barca do Inferno” no ensino básico

Ainda que a exibição seja feita a pensar num público alargado, desperta um interesse muito específico junto dos alunos e professores do 9º ano de escolaridade. A obra “Auto da Barca do Inferno” é de cariz obrigatório no ensino básico. Assim, são feitas sessões próprias durante o dia para grupos escolares. De acordo com o produtor, na próxima semana vão decorrer mais oito exibições, de terça a sexta, tanto de manhã como da parte da tarde. Pedro Rodrigues salienta que “seis destas sessões já se encontram esgotadas”.

Conceição Carvalheiro, professora de línguas no ensino básico, levou os alunos a assistirem à peça nos últimos três anos, sendo os deste ano alunos estrangeiros. Sublinha a visualização do teatro como uma alternativa dinâmica e, inclusive, alterou “a cronologia do programa para os alunos poderem ver a peça ao mesmo tempo que a estudavam”. Afirma, ainda, que “a própria língua traz uma mensagem histórica; o tesouro em si não é somente a obra literária”.

500 anos após a grande estreia, a obra demonstra-se intemporal ao abordar temas “profundamente relacionados com a condição humana, noções como o bem e o mal, entre o interesse particular e o interesse coletivo”, afirma Pedro Rodrigues. Ambas as fontes reforçam que, apesar da ancoragem histórica, o “Auto da Barca do Inferno” vinca ideias da sociedade contemporânea, daí a sua relevância no ensino básico.

Sobre captar a essência da obra, o produtor d’A Escola da Noite acrescenta que esse foi o desafio que a companhia teatral colocou a si mesma. Argumenta ainda que o desafio se deve estender a quem fica dentro e fora do palco. Assim, propõe “aos espectadores que assistam hoje, 500 anos depois, a este espetáculo”.

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