Cultura

O outro lado do Talk Show

Entre sorrisos e luzes, convidados e anúncios, há um mundo televisivo onde as histórias reais se confundem com a própria representação. Há um “Talk Show” onde a alienação e o anormal são dominador comum. Por Fátima Geraldo

O Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra (TEUC) apresenta “Talk Show”. Uma comédia, a roçar a sátira, sobre o mundo do pequeno ecrã. Um “híbrido” entre teatro e a televisão que nos leva a questionar a veracidade dos conteúdos televisivos e que nos desperta para todo um mundo existente para lá câmaras.

Nesta peça não temos apenas um público à espera de assistir à encenação, ele é também parte da própria e terá acesso a duas realidades: ao mundo do espectáculo, das câmaras ligadas, dos aplausos, e ao mundo dos ‘corta!’, da manipulação de conteúdos, da hipocrisia. Os atores do TEUC dão, assim, vida ao mundo de ‘showbiz’ e fazem desta peça o centro de uma reflexão sobre aquilo que pode existir no mundo televisivo.

O “Talk Show” não pretende fazer uma crítica explícita à televisão. O encenador, Ricardo Vaz Trindade, alerta que “não há propriamente uma moralização”. “A manipulação começa em cada um”, quando “as pessoas fazem da televisão, às vezes, um meio alienante”, aponta.

Alienação é, aliás, outro dos grandes temas de ‘Talk Show’ que “no início era suposto só falar sobre extraterrestres e ficção científica”, explica Bárbara Pereira, atriz e atual presidente do TEUC. Apesar de algumas mudanças, fruto dos improvisos e do constante trabalho dos intérpretes, o tema inicial está presente na peça, com a existência de personagens inquietantes e que fogem à realidade, tal como a conhecemos.

Existem personagens presas ao seu próprio papel, que se encontram fartas “de ser só mãos, ser só boca, ser um objecto, ali, a servir as pessoas, para vender”, explica Inês Lopes, atriz do TEUC. Personagens perdidas nas suas convicções, personagens usadas, oferecidas a um público faminto de histórias anormais, chocantes que, afinal, não passam de simples pessoas, sem nada de extraordinário.

As personagens criam uma viagem inusitada pelos bastidores mais intimistas da interpretação humana. É um jogo entre o que se vê e o que realmente acontece, entre o que passa nos filtros e o que se corta, entre o que se transmite e o que se esconde. Não só no mundo televisivo mas na própria identidade da pessoa, que acaba por se perder no papel que tem a representar.

É este um teatro em volta do absurdo, que levanta questões sobre a individualidade do ser humano e sobre o seu valor. Um exagero em dose certa, até porque este tipo de representação “não é mais do que pegar na realidade e levá-la a um extremo”, diz Joana Marques Silva, atriz do TEUC. “Há pessoas que têm muitas das características das personagens e que, se calhar, são estas personagens. A ideia é deixar correr, correr, correr e chegar a um ponto em que tudo se torna absurdo”, afirma.

A peça está em exibição até dia 6 de dezembro, todos os dias da semana, às 21h30, no edifício da Associação Académica de Coimbra, no Teatro de Bolso do TEUC.

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